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29 de ago. de 2010

Qual é mesmo "a causa"?

Merval Pereira, em O Globo:

Logo após as denúncias contra o assessor do gabinete civil Waldomiro Diniz, flagrado apanhando propina do bicheiro Carlos Cachoeira para si e supostamente para campanhas políticas, fato revelado no início do primeiro governo Lula, o então presidente do PT, José Genoino, cunhou a seguinte frase: ‘O erro pela causa o presidente aceita. O erro em causa própria, não’.

Você já conferiu se seu nome está na lista?

A seguir, a lista em ordem alfabética das pessoas que tiveram os dados fiscais acessados, segundo a investigação da Corregedoria da Receita Federal:

Adalberto Nadur; Adeildda Ferreira Leão dos Santos; Agnaldo Carlos de Souza; Albertino Bertino Correia Lins; Alex Assaiante Donida; Alexandre Augusto Ramos Ferreira; Aluisio José de Castro Filho; Amanda Batista de Siqueira Santos; Amauri Jacintho Baragatti; Ana Carla Voltani; Ana Maria Braga Maffei; Ana Maria Rodrigues Caroto Cano; André Maia Brasil; Antonio de Souza Bina; Antonio Russo Netto; Arcio Moniz Barbosa; Armando Ferreira da Cunha; Barbara Elisabeth Laffranchi Bettoni Malta; Bernardo Valentini; Carla Estevão de Andrade Argenta; Carlos Alberto Hailer Bocuhy; Carlos Sidney Coachman; Carmen Duarte Braz; Celso José Bellini; César Jesus Camasao; Claudia Garcia Retamero; Clayton Luiz da Silva; Clovis Celestino Pereira; Conceição
da Costa; Czarda Maria Nóbrega de Mendonça; Daisy Cristina Rodrigues Conceição; Daniela Santamaria Schreiter; Darcio Tadeu Mendes; Darcy Chinelato Rossi; Denise Finochiaro; Deuzivan Alencar Aguiar; Edson Pedro dos Santos; Edson Toshiyuki Maruyama; Edson Vanderlei dos Santos; Eduardo Jorge Caldas Pereira; Eliana Aragão; Eliomar Gabriel de Pádua; Ernesto Duarte; Euclea Passarelli; Eurico de Azevedo Sodré Neto; Everaldo Gomes Ferreira; Everaldo Medeiros; Fernando Rodrigo Cano Balsanelli; Genaro Alves dos Santos; Genésio Garcia Naveros; Genivaldo José dos Santos; Geraldo Antonio Prearo; Geraldo Licinio Rosa; Giorgio Pignalosa; Gregório Marin Preciado; Heleno Pereira Neco Filho; Henrique Gomes dos Santos; Hercia Diniz Gusmão; Ilda Maria do Patrocínio da Silva; Irineu Antonio Trovo; Irineu Ballon; Ivan Salles da Silva; Jeanete Roizman; Jefferson Albarenga Alves; João Aparecido da Silva; João Batista dos Santos; Josafá Santos Brasil; José Alberto dos Santos Braz; José Bertino de Vasconcelos Filho; José Expedito Aquino Freitas; José Hildo Vieira da Silva; José Luiz Fioretto; José Luiz Lourenço; José Ramos da Silva; José Roberto de Souza; Junia Eliza da Fonseca; Junior da Silva Pacheco; Kleber Caetano; Leone Mariano; Leonel Pinto Rodrigues Figueira; Luciano Gazen; Luis Vanderlei Reis; Luiz Antonio Baptista; Luiz Antonio Cano Larios; Luiz Carlos Mendonça de Barros; Magda Rejane Chielle Barcelos; Manoel Augusto Rodrigues Foz; Manoel Batista Neto; Manoel Marques Sobrinho; Manuel Teodoro Fernandes dos Ramos; Marcelo Vanucci Leocadio; Marcio Ferreira Leão; Marcos José de Oliveira; Maria Eliane Alves; Maria Helena Ribeiro Monteiro; Marly Angela Mariano; Maurício Silva Xavier; Mauro Suaiden; Mércia Mary Diniz Gusmão; Michael Klein; Miguel Graziano Russo; Murilo Guerato; Neuza Graziano Russo; Nilo Cottini Filho; Osmar Guerato; Ozena da Silva Souza; Paula Cardoso Sabatine; Paulo Vilela Meireles; Pedro Raminelli; Pedro Victor de Oliveira Silva; Raphael Oscar Klein; Regis Gomes de Oliveira; Renata Simone Queiroz; Renato Francisco Delgado; Ricardo Sergio de Oliveira; Ricardo Soares Rocha; Ricaro
Firveda Arias; Roberto Graziano Russo; Roberto Villa Real Junior; Robson Emílio da Silva; Rogerio de Napoli; Ronaldo de Souza; Rosivaldo Macedo Wanderlei; Samuel Klein; Sandra Regina Juliani; Sandra Taeko Amanuma; Sandro Rodrigo de Souza; Santuza Borges de Andrade; Sidney Paulo Alves; Silton Hugo Schreiter; Stefano Navarro de Barros Ibrahim; Thais Barros Reis; Thelma Mendonça; Thiago Ramos Pignalosa; Valdecir de Souza; Valdemir Cunha Lopes; Waldemar dos Santos Braz; Waldemar dos Santos Braz Filho; Waldemar Vicente Magalhães; Waldemir do Vale.

20 de ago. de 2010

O COMBATE AO TERRORISMO

O Antiterrorismo e o Contraterrorismo

Gen Bda Res Álvaro de Souza Pinheiro

O combate ao terrorismo é conduzido em duas grandes vertentes: o antiterrorismo e o contraterrorismo. O antiterrorismo compreende a condução das medidas de caráter eminentemente defensivo que objetivam a redução das vulnerabilidades aos atentados terroristas.

Já o contraterrorismo compreende a condução das medidas de caráter eminentemente ofensivo, tendo como alvo as diversas organizações terroristas em presença, a fim de prevenir, dissuadir, ou retaliar atos terroristas.

As atividades desenvolvidas pelos órgãos de segurança nos aeroportos; as normas que regulam o relacionamento entre passageiros e tripulações nos vôos comerciais; a fiscalização exercida pelos órgãos de controle de migração e receita nos portos, aeroportos e fronteiras; a segurança instalada na proteção aos serviços públicos essenciais, bem como o patrulhamento das principais vias de transporte e comunicações, todas estão no contexto do antiterrorismo.

As operações desencadeadas por elementos especializados visando a captura de integrantes das organizações terroristas, bem como aquelas efetuadas para liberar instalações ou reféns que venham a cair sob o controle dessas organizações, estão no contexto do contraterrorismo.

A condição indispensável para o êxito é que o planejamento e a execução das ações sejam baseados num sólido e bem estruturado sistema de inteligência. A informação precisa e oportuna, alicerçada numa análise apropriada (resultado inclusive de um intercâmbio adequado, pertinente e oportuno com as mais diversas agências de inteligência internacionais) é o fundamento básico de uma bem sucedida campanha de combate ao terrorismo. A busca e a coleta multidisciplinares de informações, envolvendo todas as áreas, política, econômica, psicossocial, militar e cientifico-tecnológica, são básicas tanto na condução das operações preventivas quanto nas repressivas.

Nesse contexto, avulta a necessidade de uma plena integração entre os órgãos voltados para a segurança nacional e aqueles voltados para a segurança pública, em todos os níveis, federal, estadual e municipal. Há que se destacar que a experiência, cada vez mais, tem demonstrado uma nítida preponderância da inteligência humana sobre a de sinais e a de imagens.

Entretanto, combater o terrorismo tem se mostrado uma tarefa de crescente complexidade, em função, sobretudo, do caráter difuso e transnacional da atual ameaça terrorista.

O que se observa, na atualidade, em muitos países, é que significativa parcela da opinião pública, não raro, tem demonstrado uma certa tendência em visualizar com benevolência (quando não simpatia) as ações terroristas de caráter revolucionário. Quando os integrantes de uma determinada organização realizam atividades caracterizadas por níveis extremados de violência, inclusive com baixas entre inocentes cidadãos comuns, desde que se divulgue que as suas motivações foram de ordem político-ideológica, isso por si só, seria o suficiente para não mais enxergá-los como hediondos assassinos frios e calculistas, mas, sim, como heróicos combatentes que estão corajosamente prontos a se imolar pelos mais nobres ideais de liberdade.

Uma crescente antipatia, e até mesmo revolta, pelas posições adotadas pela política de relações exteriores do governo dos EUA tem contribuído significativamente para que mesmo autoridades governamentais manifestem o seu pretenso dilema, entre considerar tais revolucionários como terroristas ou como idealistas exemplares.

Por outro lado,observa-se que, muito freqüentemente, o noticiário internacional tem levado a opinião pública de vários países a visualizar as comunidades muçulmanas, de uma maneira geral, como tremendamente perniciosas e, sobretudo, altamente perigosas. Essa visão que, via de regra, origina-se numa propaganda profundamente estereotipada, possibilita o aparecimento, totalmente injustificado na maioria dos casos, das mais torpes e covardes formas de preconceito.

Outro aspecto que, não raro, a opinião pública entende como altamente controvertido é o rigor eventualmente verificado nas ações contraterroristas.

Nas primeiras horas de 14 de outubro de 2001, um domingo, um dos líderes do Hamas, Abdel Rahman Hamad, após haver concluído as suas preces, colocou-se de pé na cobertura de sua casa. Numa fração de segundo, viu-se alvejado no peito por dois projéteis que o mataram instantaneamente. Esta ação executada por um atirador de escol israelense, foi o coroamento de uma operação de inteligência de alguns meses. Abdel Hamad era o coordenador das ações envolvendo o emprego de terroristas suicidas de sua organização.

Eventos como esse caracterizam um programa, identificado na mídia internacional como "targeted killing" , conduzido pelos órgãos de segurança israelenses, extremamente relevante no contexto de sua campanha de contraterrorismo. É importante ressaltar que as autoridades israelenses jamais confirmaram a existência de tal programa. As críticas a essa forma de conduzir "a guerra contra o terror" têm se mostrado bastante contundentes e originam-se em diferentes partes do mundo, inclusive nos EUA (muito embora tenham arrefecido nesse País, após o 11 de setembro).

Não há dúvida de que procedimentos dessa natureza contrariam ostensivamente qualquer política de direitos humanos, bem como estão em confronto direto com as leis internacionais. O dilema em questão é como os órgãos de segurança vão aproveitar de forma compensadora as raras oportunidades de golpear decisivamente as organizações terroristas que combatem, ao mesmo tempo em que evitem que os líderes capturados venham a ser objeto de ações terroristas futuras, que demandem a sua libertação em troca por reféns?

Destaque-se que as situações de resgate de reféns são as mais críticas a serem enfrentadas no contexto das operações contraterrorismo. Estas não permitem outra opção que não uma ação rápida e violenta, baseada na surpresa e na ação de choque, que não possibilite aos terroristas qualquer reação contra os reféns. Não é por mero diletantismo que as mais capacitadas unidades de Forças Especiais do mundo adestram-se intensiva e o mais realisticamente possível, num tipo de instalação internacionalmente conhecida como "killing house", visando estarem preparadas para eventos dessa natureza.

A verdade é que tanto as operações preventivas quanto as repressivas, freqüentemente se deparam com complexas situações onde está presente uma desconfortável ambigüidade naquilo que se refere aos aspectos legais e morais. E a realidade tem demonstrado que as decisões críticas a serem tomadas devem estar nas mãos de autoridades absolutamente conscientes de sua responsabilidade no que se refere ao êxito ou ao fracasso do combate ao terrorismo.

10 de ago. de 2010

Isso não pode continuar

por Augusto Nunes, da Veja

Os condenados pelos narcoterroristas ao horror que não tem prazo para terminar

Elkin Rivas, aos 22 anos

Ele não dorme numa cama há quase 12 anos. Atravessa as noites acorrentado pelo pescoço, pelos braços ou pelas pernas a um tronco de árvore, com o corpo estendido sobre uma camada de plástico fino como o dos sacos de lixo, exposto a picadas de insetos ou ataques de animais da selva. Há 143 meses não vê televisão, não usa computador, não lê revistas nem jornais, não conversa sem restrições sobre qualquer assunto. E está proibido de manter relações sexuais há mais de 4 mil dias.

Sequestrado pelas Farc em 13 de outubro de 1998, Elkin Rivas sobrevive há quase 100 mil horas ao mais brutal dos cativeiros. Ele tinha 22 anos e era tenente da polícia colombiana quando foi capturado sem ter cometido qualquer crime e sentenciado, sem julgamento formal, a um tipo de horror que não tem prazo para terminar. Aos 34, não sabe quando ─ ou se ─ retomará a vida interrompida. Enquadrado na categoria dos “reféns políticos”, Elkin é um dos 13 remanescentes do grupo cuja soltura as Farc condicionam desde 2006 ao indulto de 500 narcoterroristas capturados pelo governo e condenados pela Justiça.

O governo de Álvaro Uribe recusou a troca quando os cativos eram 60 e incluía senadores, entre os quais a ex-candidata à presidência Ingrid Betancourt, vários deputados, um general e até três agentes americanos. É improvável que o presidente Juan Manuel Santos aceite um acordo agora que só restaram oficiais de baixa patente. Se tiver muita sorte, uma operação militar poderá devolver a Elkin o direito de ir e vir. Mas nada lhe devolverá o que perdeu além da liberdade.

Perdeu para sempre os melhores anos da mocidade. Ao contrário de todos os amigos que continuaram longe da selva, não pôde namorar, casar-se, ter filhos, conversar nas mesas dos bares, conviver com a família, ir ao cinema, dançar, jogar futebol, comer o prato preferido, comemorar o aniversário ─ foram-lhe confiscados todos os pequenos prazeres inseparáveis do ato de viver. Se o tempo na selva escorre com apavorante lentidão para todos os sequestrados ─ mais de 600, calcula-se ─ o mundo segue seu curso com velocidade crescente. E mudou de século e de cara entre o outono de 1998 e o inverno de 2010.

Enquanto perdia a saúde para as doenças da selva, enquanto perdia as forças em caminhadas na mata que frequentemente duram sete dias, Elkin perdeu a chance de contemplar as mudanças na paisagem planetária. A Colômbia realizou três eleições presidenciais, alguns países nasceram e outros morreram, as Torres Gêmeas sumiram, os Estados Unidos se envolveram em três guerras e elegeram um presidente negro, um cardeal alemão tornou-se papa. Elkin não viu nada disso.

A China se transformou na segunda potência, um homem correu 100 metros em 9 segundos e 58 milésimos, Plutão deixou de ser planeta, descobriu-se que existe água em Marte e na Lua. Houve três Olimpíadas, três Copas do Mundo, o enforcamento de Saddam Hussein, o tsunami no Pacífico, o terremoto no Haiti, a troca de Fidel Castro pelo irmão Raúl. A União Européia adotou o euro como moeda padrão, a Voyager ultrapassou as fronteiras do sistema solar, o dialeto do universo digital incorporou à linguagem corrente expressões, palavras e siglas como pen-drive, Orkut, iPod, Wikipédia, Youtube, iPhone, Twitter, Facebook ou Google. Elkin perdeu tudo isso.

Só não perdeu de vez a esperança por não ter perdido a mãe, Magdalena Rivas, que há quase 12 anos impede o filho de sucumbir ao medo do esquecimento. Entre as fobias que escoltam permanentemente um refém, nenhuma é tão angustiante. “O governo precisa lembrar-se dos que continuam prisioneiros das Farc”, repetiu Magdalena em 6 de junho, depois de receber a prova mais recente de que o filho continua vivo: num vídeo, Elkin diz que está bem e pede desculpas aos pais “pelo sofrimento que causou”.

Em julho, Magdalena animou-se com a bem sucedida operação que resgatou o general Luis Mendieta, o coronel Enrique Murillo, o capitão Willian Donato e o sargento Arbey Delgado. Mas logo foi assaltada pela hipótese aflitiva: “Essa gente pode agir em represália contra os sequestrados”, assustou-se. “Eles continuam lá, acorrentados, numa situação que uma mãe não consegue entender”.

O presidente Hugo Chávez não só compreende como aprova, apoia e financia os quase 8 mil carcereiros das Farc. Denunciado por Álvaro Uribe por hospedar 1.500 narcoterroristas, Chávez primeiro tentou desmentir o crime copiosamente documentado, depois rompeu relações com a Colômbia e, ao enfim admitir a existência das bases paramilitares em território venezuelano, reiterou as juras de inocência. Neste domingo, voltou a simular interesse pela sorte dos reféns supliciados pela organização criminosa que patrocina.

“O Brasil tem uma posição neutra sobre as Farc”, disse ao jornal francês Le Figaro o conselheiro presidencial Marco Aurélio Garcia. Como se não fosse obscena a neutralidade que iguala um governo constitucional a um bando narcoterrorista. O presidente Lula faz de conta que nunca houve o desafio reiterado pelas Farc desde 1964. “Nós não temos guerras neste continente”, recitou o chefe de governo ao candidatar-se a mediador da crise que envolve a Colômbia e a Venezuela. “Só existem conflitos verbais”. São declarações deploráveis, retrucou Uribe.

O adjetivo é brando. Como advertiu o presidente colombiano, quem não enxerga nas Farc uma ameaça intolerável à democracia é, na hipótese mais misericordiosa, um comparsa de liberticidas e um cúmplice de carrascos. Se não há guerra, como fantasia Lula, então não há prisioneiros de guerra. Os elkins acorrentados na selva, portanto, não existem.

Enquanto um jovem colombiano tentava dormir acorrentado, o palanqueiro profissional desfrutou os oito melhores anos de sua vida. É demais cobrar compaixão de quem não sabe o que é isso. Mas os homens decentes devem exigir que Lula pelo menos interrompa o espetáculo do cinismo.

Elkin Rivas, aos 34 anos