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27 de fev. de 2013

"Black Elk Speaks"

Alce Negro Fala é um livro fruto do encontro, ocorrido em 1930, de John Neihardt com um ancião índio Sioux Oglala. Neihardt andava à procura dos remanescentes do movimento messiânico indígena que culminou no massacre de Wounded Knee, em 1890. Mais especificamente, andava à procura de algum "medicine-man" que houvesse atuado como guia espiritual daquele movimento. Encontrou Alce Negro, ... que já estava à sua espera, aguardando a chegada de um ouvinte a ele destinado...
Exímio "contador de histórias", Alce Negro encarna à perfeição as tradicionais personagens encarregadas da transmissão oral da cultura, espécie de oráculos, por assim dizer, comuns nos povos antigos. 
Assim, suas narrativas não são meras reminiscências de um idoso, ou enumeração sistemática de fatos históricos relevantes; antes, são elaborações intencionadas, vivificadas pela sua experiência, conhecimento e sabedoria. Produzem bem mais do que uma satisfação da curiosidade, ou um encantamento com o diferente, também ali presentes, mas transmitem deliberadamente um discernimento dos fatos, além dos fatos em si - o que vem a ser, afinal, o seu real propósito e o exercício de sua arte de educador.
Segue uma amostra, para apreciação, com a ressalva de que o conjunto da obra é muito mais abrangente do que possa fazer supor este pequeno conto:
  

(...) ainda me lembro de uma estória que ele me contou acerca de um jovem lakota chamado Cavalo Alto (High Horse), e das dificuldades por que passou para conseguir a rapariga que queria. Uatani disse-me que tudo aconteceu exatamente como ele me contou, o que é bem provável. Mesmo que não tenha sido assim, podia tê-lo sido. É essa história que te vou contar agora.

O Namoro de Cavalo Alto

   Nos velhos tempos não era tarefa fácil arranjar uma rapariga para casar. Muitas vezes era mesmo bastante penoso e implicava grande espírito de sacrifício. Imaginemos que eu sou um jovem e vi uma rapariga tão bonita que fico doente de amor só de pensar nela. Não posso simplesmente chegar ao pé dela, dizer-lhe o que sinto, e casar com ela se ela estiver de acordo. Primeiro tenho de usar toda a minha astúcia para conseguir falar com ela, e isto é só o começo de uma longa história.
   Imaginemos que gosto tanto de uma rapariga que ela não me sai da cabeça, mas que ela não me liga e os pais a vigiam de perto. Vou-me sentindo pior a cada dia que passa; então, talvez me aproxime furtivamente do tipi dela, ao abrigo do escuro, esperando que ela saia. É possível que ali passe toda a noite, sem dormir, e que ela não saia do tipi, fazendo-me sentir ainda pior. Também pode acontecer que me esconda num arbusto perto da nascente onde ela vai buscar água, e quando ela surgir, se ninguém estiver a ver, salto-lhe ao caminho, retenho-a e faço com que ela me ouça. Fico desde logo a saber se ela gosta de mim, pois, se for esse o caso, há-de ficar embaraçada e, possivelmente, não dirá uma palavra e nem sequer me olhará de frente. Então deixo-a ir e fico à espreita da oportunidade para me encontrar com o pai a sós, para lhe dizer quantos cavalos lhe posso dar em troca de sua bela filha. Nessa altura hei-de encontrar-me em tal estado que seria capaz de lhe oferecer todos os cavalos do mundo se os tivesse.
   Voltando a Cavalo Alto, havia lá na aldeia uma rapariga tão bonita aos olhos dele que andava doente de tanto pensar nela, e cada dia pior. A rapariga era bastante tímida e os pais estavam-lhe muito presos, pois já não eram jovens e ela era filha única. Vigiavam-na de perto durante todo o dia e arranjavam maneira de a terem segura também de noite, enquanto dormiam. Estavam de tal modo obcecados com ela que lhe fizeram um leito de peles, e depois de saberem que Cavalo Alto andava a tentar aproximar-se dela atavam-na à cama com tiras de pele durante a noite para que ninguém a levasse enquanto dormiam, pois também não tinham a certeza se a rapariga não estava à espera de ser levada. Depois de rondar nas imediações durante algum tempo, escondendo-se à espera da rapariga e cada vez mais desesperado, Cavalo Alto conseguiu finalmente apanhá-la sozinha e obrigá-la a falar com ele, ficando a saber que ela talvez gostasse um bocadinho dele. A situação, já se vê, não melhorou muito; bem pelo contrário, agravou-se ainda mais, mas agora Cavalo Alto sentia-se forte como um bisão e foi falar diretamente com o pai, dizendo-lhe que gostava tanto da filha que lhe oferecia dois bons cavalos por ela, um novo e o outro ainda em muito bom estado. Mas o ancião limitou-se a fazer um gesto com a mão, dando a entender a Cavalo Alto que este devia parar de dizer tolices e ir-se embora.
   Cavalo Alto ficou mais desesperado que nunca. Entretanto, um outro jovem disse que lhe emprestava dois cavalos que mais tarde deveriam ser retribuídos. Cavalo Alto foi de novo ter com o ancião, oferecendo-lhe desta vez quatro cavalos pela filha, dois novos e os outros dois ainda com vigor. Mas o pai da rapariga voltou a agitar a mão sem proferir palavra. Cavalo Alto voltou a rondar o local até conseguir falar novamente com a rapariga, pedindo-lhe que fugisse com ele, dizendo-lhe que se ela não acedesse ele era capaz de morrer ali mesmo. Mas ela não acedeu, dizendo-lhe que queria ser comprada como uma mulher que se preza. Por aqui se vê que ela também se tinha em boa consideração.
   Esta recusa pôs Cavalo Alto em tal estado que deixou de comer, caminhando tão cabisbaixo que dava a ideia de poder tombar e morrer a qualquer momento. Veado Vermelho (Red Deer) e Cavalo Alto eram grandes amigos, andando quase sempre juntos. Reparando no comportamento do amigo, perguntou-lhe Veado Vermelho: “Primo, o que tens tu? Andas mal da barriga? Tens ar de quem está para morrer.” Então Cavalo Alto contou-lhe o que se passava, dizendo-lhe que não conseguiria viver muito mais se não casasse depressa com a rapariga. Depois de refletir durante algum tempo, Veado Vermelho falou assim: “Primo, tenho um plano; se fores homem para fazer o que eu disser há-de dar tudo certo. Está visto que ela não vai fugir contigo e que o pai não aceita quatro cavalos, quando quatro cavalos é tudo que lhe podes oferecer. A única alternativa que te resta é raptá-la e depois fugir com ela. Regressas passado algum tempo, e nessa altura o pai já nada pode fazer porque ela será tua mulher. Aliás, o mais provável é que ela queira mesmo que a leves à força.” 
   Puseram-se os dois a acertar os pormenores, dizendo Cavalo Alto que gostava tanto da rapariga que era homem de fazer tudo o que Veado Vermelho ou alguém lhe dissesse para fazer. Era noite alta quando os dois se aproximaram furtivamente do tipi da rapariga, pondo-se à escuta até terem a certeza de que lá dentro todos dormiam profundamente. Chegado o momento, Cavalo Alto rastejou para dentro do tipi com uma faca na mão, com a qual deveria cortar as tiras de pele que amarravam a rapariga, enquanto Veado Vermelho arrancava as estacas que seguravam o tipi daquele lado, para depois ajudar a arrastar a jovem para o exterior e amordaçá-la. De seguida, tudo o que Cavalo Alto tinha a fazer para ser feliz para o resto da vida era pô-la à sua frente em cima do cavalo e fugir.
   Quando Cavalo Alto se infiltrou no tipi estava de tal modo nervoso, ouvindo o coração bater tão alto, que teve medo de acordar os pais. Mas tal não sucedeu, e passado pouco tempo começou a cortar as tiras de pele. Sempre que cortava uma ouvia-se um estalo que quase o matava de medo. Já havia cortado todas as tiras até às coxas da moça quando, num gesto de maior nervosismo, a faca se lhe escapou, picando a rapariga, que lançou um enorme grito. Os pais saltaram da cama e puseram-se também a gritar. Por esta altura já Cavalo Alto saíra do tipi e se pusera em fuga com Veado Vermelho, mais parecendo duas corças. Os pais e alguns outros foram atrás dos jovens, mas estes haviam-se sumido no escuro e ninguém soube quem eram.
   Se já alguma vez desejaste uma rapariga bonita, deves adivinhar o estado lamentável em que Cavalo Alto se encontrava nesse momento. Sentia-se profundamente infeliz, tendo o aspecto de quem vai morrer à fome, isto se não caísse morto a qualquer momento. Veado Vermelho continuou a pensar no caso e, passados alguns dias, foi ter com Cavalo Alto e disse-lhe assim: “Primo, não desanimes! Tenho outro plano e tenho a certeza de que, desta vez, se tiveres coragem, tudo vai dar certo.” Cavalo Alto respondeu-lhe assim: “Tenho mais do que coragem para fazer tudo o que alguém possa imaginar, desde que consiga ficar com a rapariga.”
   Depois de se terem afastado da aldeia, Veado Vermelho disse a Cavalo Alto para este se despir completamente. De seguida pintou o corpo do amigo todo de branco com listras pretas por cima e círculos, também eles pretos, à volta dos olhos. Cavalo Alto ficou com um aspecto tão assustador que Veado Vermelho, depois de acabada a pintura e de olhar bem para o amigo, não deixou de se assustar um bocadinho. “Agora, se voltares a ser surpreendido, ficarão tão assustados que hão-de pensar que és um espírito mau e terão medo de ir atrás de ti”, explicou Veado Vermelho.
   Já a noite ia alta e todos dormiam a sono solto quando os dois se aproximaram novamente do tipi da rapariga. Tal como da primeira vez, Cavalo Alto infiltrou-se no tipi de faca na mão, enquanto Veado Vermelho esperava do lado de fora, pronto para arrastar a moça para o exterior e amordaçá-la quando o amigo tivesse cortado todas as tiras. Cavalo Alto aproximou-se silenciosamente do leito da jovem e começou a cortar as tiras, sem deixar de pensar: “Se me vêem assim com esse aspecto ainda me dão um tiro.” A rapariga estava com o sono inquieto, às voltas na cama, e Cavalo Alto progredia lentamente e com cuidado por causa do barulho que as tiras faziam ao serem cortadas. Mas algum barulho ele deve ter feito, porque a mãe da jovem acordou de repente, dizendo para o marido: “Acorda homem! Está alguém dentro do tipi!” O pai, no entanto, estava bastante ensonado e não queria ser incomodado. “É claro que está alguém dentro do tipi”, replicou ele, “Vê lá se dormes e não me aborreças.” E voltou a ressonar.
   Cavalo Alto ficou de tal modo assustado que se quedou colado ao chão o mais que podia. Mas, como compreendes, há muito tempo que ele não dormia bem por causa da rapariga, e enquanto ali esteve deitado à espera de ouvir a mulher ressonar esqueceu-se de tudo, até da beleza da jovem. Veado Vermelho, que esperava do lado de fora o momento de intervir, não parava de pensar no que estaria a acontecer dentro do tipi, mas não se atreveu a chamar pelo amigo. Com o dia prestes a nascer, Veado Vermrlho viu-se obrigado a abandonar o local com os dois cavalos que trouxera para o amigo e para a rapariga, porque se arriscava a que alguém desse com ele.
   Quando a luz começou a entrar no tipi e a rapariga acordou, vendo um animal aterrador, todo branco e com listras negras, jazendo adormecido ao lado da cama, pôs-se a gritar, logo seguida pelos pais. Cavalo Alto levantou-se de um salto, assustado de morte, quase deitando o tipi abaixo na fuga. De toda a aldeia começou a acorrer gente armada com espingardas, arcos e machados, tudo aos gritos. Mas Cavalo Alto corria agora tão depressa que mal tocava com os pés no chão, e o aspecto dele era tão assustador que todos se afastavam do seu caminho, deixando-o fugir. Alguns mais destemidos quiseram disparar sobre ele, mas os outros impediram-nos, dizendo que podia tratar-se de um ser sagrado e que matá-lo podia trazer alguma desgraça. Cavalo Alto fugiu em direção ao rio, não muito longe dali, e no meio da vegetação descobriu um tronco oco onde se escondeu. Passado algum tempo, uns quantos homens aproximaram-se do local, e Cavalo Alto ouviu-os dizer que podia tratar-se de algum espírito mau que saíra da água e que para lá tinha voltado.
   Nessa manhã houve ordens para levantar o acampamento e seguir viagem, o que aconteceu com Cavalo Alto escondido no seu tronco oco. Veado Vermelho, que assistira a tudo do seu tipi, tentava parecer tão surpreendido e assustado como os outros. Assim, quando todos se puseram em marcha, voltou sorrateiramente ao local onde vira desaparecer o amigo. Uma vez aí chegado, pôs-se a chamar pelo companheiro, obtendo resposta pronta, pois Cavalo Alto reconhecera-lhe a voz. Depois de ajudar o amigo a lavar a tinta do corpo, sentaram-se os dois na margem a falar dos problemas de cada um. Cavalo Alto disse que nunca mais voltaria à aldeia enquanto fosse vivo e que nada se importava com o que lhe acontecesse, acrescentando que ia enveredar sozinho pela senda da guerra. “Nem penses que vais para a guerra sozinho, primo, pois eu vou contigo”, disse-lhe Veado Vermelho.
   Veado Vermelho fez todos os preparativos e nessa noite entraram os dois na senda da guerra. Após vários dias de caminho, avistaram um acampamento Crow (os Crows e os Lakotas eram inimigos) ao pôr-do-sol. Esperando pelo cair da noite, aproximaram-se furtivamente do local onde os cavalos pastavam, mataram o guarda que, imaginando os lakotas bem afastados dali, estava longe de pensar em inimigos, e puseram em fuga cerca de uma centena de cavalos. Conseguiram um bom avanço, visto que os animais debandavam a galope, e só de manhã é que os guerreiros crow conseguiram recuperar alguns cavalos. Veado Vermelho e Cavalo Alto conduziram a manada durante três dias e três noites até alcançarem a aldeia do seu povo. Uma vez no acampamento, levaram os cavalos diretamente até a entrada do tipi da rapariga. O pai estava lá dentro e Cavalo Alto chamou-o, perguntando-lhe se aqueles cavalos eram suficientes para ficar com a rapariga. O ancião, desta vez, não fez qualquer gesto com a mão. Não eram os cavalos que ele queria. O que ele queria era um filho que fosse um homem a valer e que prestasse para alguma coisa.
   E assim Cavalo Alto acabou por conseguir a rapariga, e eu acho que ele bem a mereceu.

26 de fev. de 2013

Yoani Sánchez no Roda Viva

Imperdível. Pura kriptonita. Inteligentíssima. Exímia leitora de entrelinhas e de intenções subjacentes. Detonadora sorridente.









Indecentes úteis


por Dora Kramer

Aqueles que não conseguem convencer, quando fanáticos agridem, constrangem e, se lhes for dada a oportunidade, prendem e arrebentam.

Foi a nítida impressão deixada pela ação orquestrada a partir da Embaixada de Cuba com pequenos, barulhentos e virulentos grupos defensores da ditadura Castro, contra a presença da jornalista Yoani Sanchez por uma semana no Brasil.

Tirante a violência, nada de mais grave haveria no patrulhamento não fossem dois fatos: a presença de um assessor com assento no Palácio do Planalto na reunião em que a representação de Havana distribuiu a missão aos chefes dos tarefeiros e o mutismo do PT diante dos atentados à liberdade de uma pessoa dizer o que quer a quem estiver disposto a ouvir. 

De onde fica plenamente autorizada a constatação de que esse tipo de intolerância não é episódio isolado nem nascido por geração espontânea. Foi apenas a manifestação mais histérica e malsucedida do modo petista (e área de influência) de lidar com as diferenças de ação e pensamento. 

Numa expressão já meio gasta: o exercício do contraditório. Este enlouquece o PT. E aqui se fala do partido como um todo não na intenção maldosa de generalizar, mas porque a direção deixou o senador Eduardo Suplicy literalmente falando sozinho no enfrentamento da barbárie. Do partido como um todo não se ouviu palavra, nenhum reparo, apenas ressalvas aqui e ali à "deselegância" dos indecentes úteis. 

A falta de cerimônia com que se dedicaram à selvageria é fruto do exemplo. Isso se vê quando o governo desqualifica de maneira desonesta (para não dizer mentirosa) as ações de seus antecessores - até mesmo os que hoje são seus aliados -, quando autoridades confundem crítica com falta de apreço à pátria, quando o dever de informar é classificado com desejo de conspirar, quando o exercício da oposição é "vendido" à população como uma atividade quase criminosa. 

No caso da cubana ocorreu um monumental tiro no pé: o que seria uma visita tratada com destaque, mas sem maiores consequências nem celebrações - até porque Yoani Sanchez não diz nada que já não seja de conhecimento público sobre as agruras da vida em Cuba -, no lugar da visita de uma jornalista que reclama pela adaptação de seu país à contemporaneidade, o que se teve foi uma repercussão monumental.

Ao se tornar alvo (fácil) da rebeldia sem causa, virou capa da revista de maior circulação no Brasil, falou no Congresso Nacional e foi convidada de honra em programas de entrevistas no rádio e na televisão. Bom para ela, melhor ainda para a exposição das patrulhas ao ridículo. E tem gente que ainda apoia o direito da Embaixada de Cuba de pôr os patrulheiros na rua argumentando que o fez em legítima defesa. 

Imagine o prezado leitor e a cara leitora se a Embaixada dos Estados Unidos resolvesse organizar manifestações no mesmo tom para revidar, a pretexto de proteger a moça dos ataques. O mundo viria abaixo e certamente o governo brasileiro protestaria contra a indevida intromissão. 

Expurgo. A exposição de fotos no Senado, organizada pelo PT em comemoração aos 33 anos de vida e 10 do partido no poder, simplesmente suprimiu o ano de 2005. O período em que veio a público o esquema do mensalão também desapareceu das festividades partidárias. 

Uma incoerência em relação aos protestos de injustiça e acusações de farsa que o PT faz sobre o julgamento. Acreditasse mesmo em suas alegações, o natural seria o partido aproveitar a passagem dos aniversários para ressaltar o que, na sua versão, seria algo nunca antes ocorrido no País em matéria de atentado à Justiça, aos direitos individuais e, sobretudo, à verdade.

Preferiu nada falar. De onde, se conclui, consentiu.

25 de fev. de 2013

Porque estamos nas garras do crime

do blog Vespeiro;

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Sexta-feira foi Gil Rugay que matou o próprio pai e a namorada dele - há nove anos (!!!). “33 anos e 9 meses de cadeia”, disse o juiz. “Trata-se de um criminoso dissimulado e perigoso”. E lá se foi o “condenado”, livre leve e solto, rindo, de volta para o aconchego da sua casa, talvez para esperar outros 9 anos por um novo julgamento...
Vinte e quatro horas antes eram Cristian e Daniel Cravinhos, que em 2002 massacraram com golpes de barras de ferro o casal Richthofen enquanto dormia a pedido da própria filha deles, que saíam da prisão para desfrutar o “regime semi-aberto”, por “bom comportamento”. (Tente explicar para qualquer estrangeiro que a Justiça do seu país considera soltar tipos como estes “por bom comportamento”...)
Poucas semanas antes, Sergio Costa Junior, policial que, junto com outros policiais, trucidou com 21 tiros no rosto a juíza Patricia Acioly, foi beneficiado com redução de pena “por colaborar com a justiça”...

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O jovem casal que assassinou na flor da idade Daniela Perez, filha da autora da presente novela do horário nobre da Globo, com centenas de tesouradas, anda por aí já há uns bons dois anos, solto por “bom comportamento”.
Praticamente toda semana os jornais noticiam mais uma barbaridade – assassinatos, estupros, assaltos, sequestros – perpetrada por algum bandido preso e condenado, solto da cadeia “por bom comportamento” para visitar os amigos e parentes.
Ninguém neste país, por mais monstruoso que tenha sido o seu crime, cumpre a metade de uma pena já leve demais para o peso do crime por tirar uma vida e destruir uma família para sempre.
Se for menor de idade então, nem que seja um serial killer ou um estuprador de bebês, será chamado pelas autoridades apenas de “infrator” e pode, na melhor das hipóteses ficar retido até fazer 21 anos, data em que sairá da cadeia livre e com a ficha limpa.

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Encerrei a semana passada com o post sobre Mantega e Yoani Sanchez afirmando que o ponto de ruptura que desloca o pensamento de esquerda para o campo ideo-lógico é a negação do princípio do mérito, e que negar o princípio  do mérito, ou a relação de causa e efeito implica negar também as ideias de responsabilidade individual e de livre arbítrio.
É por isso que não há polícia que chegue; é por isso que o Brasil está a mercê dos criminosos.
A esquerda brasileira não reconhece a existência da covardia nem da maldade. A mãe que mata o filho, o pai que estupra o bebê e daí para cima no vasto rol que define o lado negro do ser humano, nada, nunca, é culpa do autor do crime. Até o ódio de classe desaparece nessa hora. Rico ou pobre, é sempre “a iniquidade da ordem social” que o levou a se transformar no monstro que é.

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Daí decorre que não é a principal, a única função da cadeia é “ressocializar” o criminoso e devolvê-lo o quanto antes às ruas, e não, proteger dele o resto da sociedade. Não há monstruosidade que não possa ser redimida e apagada (menos para quem morreu; menos para quem teve seu ente querido morto) com um par de anos de “bom comportamento” na prisão.
É isso que a televisão mostra diariamente a todos os brasileiros desde que nascem. Uma vida tirada para sempre, ainda que por nada e de forma torpe e covarde, quando custa alguma coisa, custa um par de anos na cadeia entremeados de indultos e outros benefícios.
E se uma vida não vale nada, o que poderia valer alguma coisa?
Antes de mudar isso, nada mais pode mudar no Brasil.

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24 de fev. de 2013

Na veia

Iniciativa de uma menina de 13 anos, página do Facebook contabiliza 577 mil "curtições". Como o próprio nome diz, Diário de Classe trata de seu cotidiano escolar, dessa forma tornado abrangentemente público e submetido à observação e pressão da sociedade. A danadinha "entrega" até a merenda que é servida todo dia, quase sempre avaliando sua qualidade. Na escola dela não há mais nada quebrado, nem grade faltando, nem pintura em mau estado; até a eventual ausência de professores e a atuação dos substitutos é relatada e comentada. E a coisa disseminou-se para outras escolas de Santa Catarina: ela também publica o que outros alunos lhe enviam, e cobra as providências. Está aprendendo e dando aula de cidadania.

"Dream Chaser"


A “Caçadora de Sonhos” é (será) a substituta dos ônibus espaciais.
O primeiro vídeo é a animação de uma missão de apoio à Estação Espacial Internacional. O segundo, mostra detalhes de sua construção.




Veja o nascimento de um golfinho


Via LJ Maia

23 de fev. de 2013

Jewel in the Night

Chris Hadfield, a bordo da Estação Espacial Internacional, compôs e tocou:



Dá para ouvi-la também na página pessoal do astronauta, SoundCloud (lá, clicar na seta à esquerda, no alto da página); para ouvir outros sons a bordo clique aqui.

20 de fev. de 2013

Quem governa hoje o país é a lógica da reeleição


Discurso de hoje, de Aécio Neves, no Senado

 “Senhor presidente,
Senhoras e senhores senadores,
Aproveito a oportunidade, extremamente emblemática, em que o Partido dos Trabalhadores festeja os seus 33 anos de existência - e uma década de exercício de poder à frente da Presidência - para emprestar-lhes alguma colaboração crítica.
Confesso que o faço neste momento completamente à vontade, haja vista a cartilha especialmente produzida pela legenda para celebrar a ocasião festiva.
Nela, de forma incorreta, o PT trata como iguais as conjunturas e realidades absolutamente diferentes que marcaram os governos do PSDB e do PT.
Ao escolher comemorar o seu aniversário falando do PSDB, o PT transformou o nosso partido no convidado de honra da sua festa.
Eu aceito o convite até porque temos muito o que dizer aos nossos anfitriões.
Apesar do esforço do partido em se apresentar como redentor do Brasil moderno, é justo assinalar algumas ausências importantes na celebração petista.
Nela, não estão presentes a autocrítica, a humildade e o reconhecimento. Essas são algumas das matérias primas fundamentais do fazer diário da política e que, infelizmente, parecem estar sempre em falta na prática dos nossos adversários.
Mas afinal, qual é o PT que celebra aniversário hoje?
O que fez do discurso da ética, durante anos, a sua principal bandeira eleitoral, ou o que defende em praça pública os réus do mensalão?
O que condenou com ferocidade as privatizações conduzidas pelo PSDB ou o que as realiza hoje, sem qualquer constrangimento?
O que discursa defendendo um Estado forte ou o que coloca em risco as principais empresas públicas nacionais, como a Petrobras e a Eletrobrás?
O Brasil clama por saber: qual PT aniversaria hoje?
O que ocupou as ruas lutando pelas liberdades ou o que, no poder, apoia ditaduras e defende o controle da imprensa?
O PT que considerava inalienáveis os direitos individuais ou o que se sente ameaçado por uma ativista cuja única arma é a sua consciência?
A verdade é que hoje seria um bom dia para que o PT revisitasse a sua própria trajetória, não pelo espelho do narcisismo, mas pelos olhos da história.
Até porque, ao contrário do que tenta fazer crer a propaganda oficial, o Brasil não foi descoberto em 2003.
Onde esteve o PT em momentos cruciais, que ajudaram o Brasil a ser o que é hoje?
Como já disse aqui, todas as vezes que o PT precisou escolher entre o PT e o Brasil, o PT escolheu o PT.
Foi assim quando negou seu apoio a Tancredo no Colégio Eleitoral para garantir o nosso reencontro com a democracia.
Foi assim quando renegou a constituição cidadã de Ulysses.
Quando eximiu-se de qualquer contribuição à governabilidade no governo Itamar Franco e quando se opôs ao Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Em todos esses instantes o PT optou pelo projeto do PT.
Fato é que, no governo, deram continuidade às políticas criadas e implantadas pelo presidente Fernando Henrique.
E fizeram isso sem jamais reconhecer a enorme contribuição dada pelo governo do PSDB na construção das bases que permitiram importantes conquistas alcançadas no período de governo do PT.
No governo ou na oposição temos as mesmas posições. Não confundimos convicção com conveniência. Nossas convicções não nos impedem de reconhecer que nossos adversários, ao prosseguirem com ações herdadas do nosso governo, alcançaram alguns avanços importantes para o Brasil.
Da mesma forma, são elas, as nossas convicções, que sustentam as críticas que fazemos aos descaminhos da atual gestão federal.
Senhoras e senhores senadores,
A presidente Dilma Rousseff chega à metade de seu mandato longe de cumprir as promessas da campanha de 2010. Há uma infinidade de compromissos simplesmente sublimados. A incapacidade de gestão se adensou, as dificuldades aumentaram e o Brasil parou. Os pilares da economia estão em rápida deterioração, colocando em risco conquistas que a sociedade brasileira logrou anos para alcançar, como a estabilidade da moeda.
Senhoras e Senhores,
Sei que a grande maioria das senadoras e senadores conhece as dezenas de incongruências deste governo, que têm feito o país adernar em um mar de ineficiência e equívocos.
Mas o resultado do conjunto da obra é bem maior do que a soma de suas partes.
Nos poucos minutos de que disponho hoje gostaria de convidá-los a percorrer comigo 13 dos maiores fracassos e das mais graves ameaças ao nosso futuro produzidos pelo governo que hoje comemora 10 anos.
Confesso que não foi fácil escolher apenas 13 pontos.
1. O comprometimento do nosso desenvolvimento:
Tivemos um biênio perdido, com o PIB per capita avançando minúsculo 1%. Superamos em crescimento na região apenas o Paraguai. Um quadro inimaginável há alguns anos.
2. A paralisia do país: o PAC da propaganda e do marketing
O crítico problema da infraestrutura permanece intocado. As condições de nossas rodovias, portos e aeroportos nos empurram para as piores colocações dos rankings mundiais de competitividade. O Brasil está parado. São raras as obras que se transformaram em realidade e extenso o rol das iniciativas só serve à propaganda petista.
3. O tempo perdido: A indústria sucateada
O setor industrial – que tradicionalmente costuma pagar os melhores salários e induzir a inovação na cadeia produtiva – praticamente não tem gerado empregos. Agora começa a desempregar, como mostrou o IBGE. Estamos voltando à era JK, quando éramos meros exportadores de commodities.
4. Inflação em alta: a estabilidade ameaçada
O PT nunca valorizou a estabilidade da moeda. Na oposição, combateu o Plano Real. O resultado é que temos hoje inflação alta, persistentemente acima da meta, com baixíssimo crescimento. Quem mais perde são os mais pobres.
5. Perda da Credibilidade: a contabilidade criativa
A má gestão econômica obrigou o PT a malabarismos inéditos e manobras contábeis que estão jogando por terra a credibilidade fiscal duramente conquistada pelo país. Para fechar as contas, instaurou-se o uso promíscuo de recursos públicos, do caixa do Tesouro, de ativos do BNDES, de dividendos de estatais, de poupança do Fundo Soberano e até do FGTS dos trabalhadores. Recorro ao insuspeito ministro Delfim Neto, próximo conselheiro da presidente da republica que publicamente afirmou: “Trata-se de uma sucessão de espertezas capazes de destruir o esforço de transparência que culminou na magnífica Lei de Responsabilidade Fiscal, duramente combatida pelo Partido dos Trabalhadores na sua fase de pré entendimento da realidade nacional, mas que continua sob seu permanente ataque”. A quebra de seriedade da política econômica produzidas por tais alquimias não tem qualquer efeito pratico, mas tem custo devastador.
6. A destruição do patrimônio nacional: a derrocada da Petrobras e o desmonte das estatais
Em poucos anos, a Petrobras teve perda brutal no seu valor de mercado. É difícil para o nosso orgulho brasileiro saber que a Petrobras vale menos que a empresa petroleira da Colômbia. Como o PT conseguiu destruir as finanças da maior empresa brasileira em tão pouco tempo e de forma tão nefasta? Outras empresas estatais vão pelo mesmo caminho. Escreveu recentemente o economista José Roberto Mendonça de Barros: “Não deixa de ser curioso que o governo mais adepto do estado forte desde Geisel tenha produzido uma regulação que enfraqueceu tanto as suas companhias”.
7. O eterno país do futuro: o mito da autossuficiência e a implosão do etanol
Todos se lembram que o PT alçou a Petrobras e as descobertas do pré-sal à posição de símbolos nacionais. Anunciou em 2006, com as mãos sujas de óleo, que éramos autossuficientes na produção de petróleo e combustíveis. Pouco tempo depois, porém, não apenas somos importadores de derivados como compramos etanol dos Estados Unidos.
8. Ausência de planejamento: O risco de apagão
No ano passado, especialistas apontavam que o governo Dilma foi salvo do racionamento de energia pelo péssimo desempenho da economia, mas o risco permanece. Os “apaguinhos” só não são mais frequentes porque o parque termoelétrico herdado da gestão FHC está funcionando com capacidade máxima. A correta opção da energia eólica padece com os erros de planejamento do PT: usinas prontas não operam porque não dispõem de linhas de transmissão.
9. Desmantelamento da Federação: interesses do pais subjugados a um projeto de poder
O governo adota uma prática perversa que visa fragilizar estados e municípios com o objetivo de retirar-lhes autonomia e fazê-los curvar diante do poder central. O governo federal não assume, como deveria, o papel de coordenador das discussões vitais para a Federação como as que envolvem as dividas dos estados, os critérios de divisão do FPE e os royalties do petróleo assistindo passivamente a crescente conflagração entre as regiões e estados brasileiros. Assiste, também, ao trágico do Nordeste, onde faltam medidas contra seca.
10. Brasil inseguro: Insegurança pública e o flagelo das drogas
Muitos brasileiros talvez não saibam, mas apesar da propaganda oficial, 87% de tudo investido em segurança publica no brasil vêm dos cofres municipais e estaduais e apenas 13% da União. Os gastos são decrescentes e insuficientes: no ano passado, apenas 24% dos R$ 3 bilhões previstos no Orçamento foram investidos. E isso a despeito de, entre 2011 e 2012, a União já ter reduzido em 21% seus investimentos em segurança. Um dos efeitos mais nefastos dessa omissão é a alarmante expansão do consumo de crack no país. E registro a corajosa posição do governador Geraldo Alckmin nessa questão.
11. Descaso na saúde, frustração na educação
O governo federal impediu, através da sua base no Congresso, que fosse fixado um patamar mínimo de investimento em saúde pela esfera federal. O descompromisso e as sucessivas manobras com investimentos anunciados e não executados na área agridem milhões de brasileiros. Enquanto os municípios devem dispor de 15% de seus recursos em saúde, os estados 12%, o governo federal negou-se a investir 10%. As grandes conquistas na área da saúde continuam sendo as do governo do PSDB: Saúde da Família, genéricos, política de combate à AIDS. Com a educação está acontecendo o mesmo. O governo herdou a universalização do ensino fundamental, mas foi incapaz de elevar o nível da qualidade em sala de aula. Segundo denúncias da imprensa, das 6 mil novas creches prometidas em 2010 , no final de 2012, apenas 7 haviam sido entregues.
12. O mau exemplo: o estímulo à intolerância e o autoritarismo.
Setores do PT estimulam a intolerância como instrumento de ação política. Tratam adversário como inimigo a ser abatido. Tentam, e já tentaram por ... cercear a liberdade de imprensa. E para tentar desqualificar as críticas, atacam e desqualificam os críticos, numa tática autoritária. Para fugir do debate democrático, transformam em alvo os que têm a coragem de apontar seus erros. A grande verdade é que o governo petista não dialoga com essa Casa, mantendo-o subordinado a seus interesses e conveniências, reduzindo- o a mero homologador de Medidas Provisórias.
13. A defesa dos maus feitos: a complacência com os desvios éticos.
O recrudescimento do autoritarismo e da intolerância tem direta ligação com a complacência com que setores do petismo lidam com práticas que afrontam a consciência ética do país. Os casos de corrupção se sucedem, paralisando áreas inteiras do governo. Não falta quem chegue a defender em praça pública a prática de ilegalidades sobre a ótica de que os fins justificam os meios. Ao transformar a ética em componente menor da ação política, o PT presta enorme desserviço ao país, em especial às novas gerações.
Senhoras e senhores,
A grande verdade é, nestes dez anos, o PT está exaurindo a herança bendita que o governo Fernando Henrique lhe legou. A ameaça da inflação, a quebra de confiança dos investidores, o descalabro das contas públicas são exemplos de crônica má gestão.
No campo político, não há mais espaço para tolerar o intolerável. É intolerável, Senhoras e Senhores, a apropriação indevida da rede nacional de rádio e TV para que o governante possa combater adversários e fazer proselitismo eleitoral.
É intolerável o governo brasileiro receber de representantes de um governo amigo do PT informações para serem usadas contra uma cidadã estrangeira em visita ao nosso país.
Diariamente, assistimos serem ultrapassados os limites que deveriam separar o público do partidário.
E não falo apenas de legalidade. Falo de legitimidade. Vejo que há quem sente falta da oposição barulhenta, muitas vezes irresponsável feita pelo PT no passado.
Pois digo com absoluta clareza: não seremos e nem faremos esta oposição.
Agir como o PT agiu enquanto oposição faria com que fôssemos iguais a eles. E não somos.
Não fazemos oposição ao Brasil e aos brasileiros. Jamais fizemos.
Tentando mais uma vez dividir o país entre o nós e o eles, entre os bons e os maus, o PT foge do verdadeiro debate que interessa ao Brasil e aos brasileiros.
Como construiremos as verdadeiras bases para transformarmos a administração diária da pobreza em sua definitiva superação?
Como construiremos as bases para um desenvolvimento verdadeiramente sustentável e solidário com todos os brasileiros?
A esta altura, parece ser esta uma agenda proibida, sem qualquer espaço no governismo.
Até porque, Senhoras e Senhores, se constata aqui o irremediável: não é mais a presidente quem governa. Hoje, quem governa hoje o país é a lógica da reeleição.
Muito obrigado.”

18 de fev. de 2013

Algo me faz lembrar Gandhi


Yoani Sánchez chega ao Brasil
Reportagem de hoje, no Estadão

Roberto Pereira/Estadão
Ativista foi recebida por amigos e manifestantes que a acusavam de 'trair o movimento'
A blogueira cubana e colunista do 'Estado' Yoani Sánchez já está no Brasil. Ela desembarcou no Aeroporto Internacional dos Guararapes, em Recife, por volta de 0h30 desta segunda-feira, 18. A ativista foi recebida por amigos e, ainda no saguão do aeroporto, manifestantes carregavam faixas, na qual acusavam Yoani de 'trair o movimento, receber dinheiro americano para ser revolucionária, além de ter uma conta milionária'. 
Yoani Sánchez saiu de Havana neste domingo, 17, em direção ao Brasil. O País é a primeira escala de um giro que a opositora do regime castrista - uma das mais famosas mundo afora - pretende empreender por mais de dez nações, das Américas e da Europa, nos próximos meses. A expectativa é que a dissidente chegue em São Paulo na noite da quarta-feira.
“Levo comigo uma mensagem de esperança. Não sou ingênua, me dou conta dos problemas, mas creio no futuro”, afirmou Yoani a repórteres no Aeroporto Internacional José Martí, pouco antes de embarcar para o Recife, fazendo uma escala na Cidade do Panamá. “Isso será como 'A volta ao mundo em 80 dias'.”
Vestida com uma saia azul-marinho e uma blusa larga branca, a blogueira de 37 anos despediu-se de seu filho adolescente, Teo, e de seu marido, o também dissidente Reinaldo Escobar, antes de passar pela checagem para deixar seu país. Aproximou-se sorrindo da cabine do agente de imigração, que, timidamente, também exibia um sorriso.
“Meu nome não soou nos alto-falantes, não me levaram a um quarto para despir-me ou “ler a cartilha para mim”. Tudo está saindo bem. (Foi) muito calorosa a reação dos (demais) passageiros comigo. Há abraços, fotos em conjunto... já sinto o cheiro da liberdade”, tuitou Yoani momentos depois. No microblog, a ativista mostrou-se ainda mais deslumbrada com as experiências que a aguardavam: “Me disseram que o aeroporto do Panamá, onde farei escala, tem uma zona wi-fi (internet sem fio)... não posso acreditar!”.
Mas Yoani não era apenas otimismo. “Minha preocupação é com os que ficam. Temo que a penalização à diferença continue”, tuitou, afirmando que tem receio ainda de que “os atos de repúdio se mantenham”.
“Temo que as detenções arbitrárias continuem como uma ferramenta de repressão. Temo que o grito se mantenha como política de Estado. Temo que neste tempo minha ilha não avance nenhum passo no respeito à diversidade ideológica, que o extremismo político permaneça.”
Em seus últimos tuítes antes de o avião decolar, porém, a blogueira manifestou certo alento: “No entanto, tenho muitas esperanças. Tenho esperanças de que a pequena voz que a cidadania alcançou seja escutada mais forte, se faça mais firme e clara. Tenho esperanças de que o absurdo não pode durar muito mais”.
Recife. Na capital pernambucana, Yoani seria recebida no início da madrugada de segunda pelo cineasta Dado Galvão e pelo blogueiro Rafael Velame, organizadores da “vaquinha” que possibilitou a vinda da cubana para o Nordeste brasileiro. Às 19 horas de segunda, deverá ser exibido o documentário Conexão Cuba Honduras, em Feira de Santana, Bahia.
Na quinta-feira, às 10 horas, a cubana participa do debate “Conversa com Yoani”, na sede do Estado, na zona norte de São Paulo. No mesmo dia, encontra-se com blogueiros na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, no fim da tarde, e logo depois lança a nova edição de seu livro De Cuba, com Carinho, publicado pela Editora Contexto, e concede uma sessão de autógrafos.


Yoani Sánchez, ao lado do cineasta Dado Galvão, chega ao Brasil: militantes pró-ditadura no encalço (Edmar Melo/EFE)

[“Isso é a democracia. Queria que em meu país pudéssemos expressar opiniões e propostas diferentes com esta liberdade”.]

Tara

Aquela velha praxis de recriar o passado.



17 de fev. de 2013

E da esbórnia fez-se a ordem

Grande post do blog Vespeiro:



Não, nem tudo está perdido. Há razões para sermos otimistas.

Na ressaca da queda do Congresso Nacional (Renan, Henrique Eduardo Alves) segui para os feriados do Carnaval, um tanto deprimido, com uma pergunta – “Porque o povo não reage?” (aqui) – e uma meia resposta – “Não ha ética, senhores. O que pode haver é polícia…” (aqui).

Três dias depois a leitora Helena Maria de Souza que, a julgar pelo que ela nos deixa entrever, é professora de escola pública, reagiu no espaço para comentários aqui doVespeiro, mas com outro desabafo parecido com o meu (aqui):

“Nós adoramos depender do Estado (pai patrão)…”, dizia ela.

“Tanto nas universidades quanto nos hospitais (públicos) o que mais se vê é a briga pelo poder”…



“É preciso que todos se sintam incapacitados, dependentes do Estado, dos governos e dos demagogos de plantão”…

“…revoltar-se contra o lulo-petismo implantado no país é ter de revoltar-se contra si mesmo. E deixar de se ver no espelho. Isto é possível?????

Com a palavra a psicanálise”.

Sim, Helena, tudo que você descreve é verdade.

Eu só discordo do verbo. Não é assim que nós somos. É assim que nós estamos.

E isso faz toda a diferença.

O homem é o bicho mais maleável da Natureza. O que mais rapidamente aprende com a adversidade e molda o seu comportamento para adaptar-se a ela.



Mas isso é uma faca de dois gumes.

Se esta característica jogou decisivamente a nosso favor enquanto se tratou de escapar ao jugo da Natureza, ela passou a jogar contra nós desde que, libertados dele, o problema passou a ser escapar ao jugo dos outros homens.

Você mencionou a “luta pelo poder”. Este é, pode-se dizer, um dos traços “recessivos” da nossa condição ancestral.

“Lutamos pelo poder” com as pernas e com os dentes enquanto foram essas as armas a definir quem tinha e quem não tinha o direito de transmitir os seus genes para mais adiante. Passaremos, eu espero, a faze-lo exclusivamente com o cérebro e a aplicação do conhecimento se chegarmos, um dia, a banir completamente a força bruta dessa contenda. Mas por enquanto, nesta fase intermediária em que nos encontramos, num ambiente onde a economia substitui a fome pura e simples que nos movia antes, a condição econômica de cada um é que passou a ser o fator de decisão.



As pernas e os caninos continuam lá, onde sempre estiveram, a nos lembrar do que essencialmente somos. Mas já não é a jugular do próximo que é preciso, literalmente, morder para ganhar o direito de continuar por aí e garantir um lugar para a sua posteridade. Basta aferrar-se a alguma boa veia da economia para garantir, para si e para os seus, um lugar ao sol.

A regra de ouro de Darwin – “sobrevivência dos mais adaptados” – continua valendo, intacta.

O que foi, então, que mudou?

Mudou quem faz a regra do jogo. Antes era a Natureza. E alterar a qualidade da regra estava totalmente fora do nosso alcance. Hoje a regra é feita por outros homens. Pode, portanto, ser alterada.

É a este progressivo ganho de manobrabilidade sobre a regra que se resume a epopéia que chamamos de “esforço civilizatório”.



O Brasil inteiro assistiu, por estes dias, os desfiles das escolas de samba do Rio e de São Paulo tantas vezes invocados, geralmente pelo lado negativo, como o retrato do que somos enquanto sociedade. Li que o ex-presidente do Banco Central, Henrique Meireles, falou da complexa organização que esses desfiles envolvem, mas perdi a matéria quando saiu e não sei em que termos ele o fez. De qualquer maneira a observação é preciosa.

Uma escola de samba evoluindo pela avenida é algo muito mais complicado que os mecanismos de relojoaria que, no passado, fizeram a fama mundial do modo de organização suíço.

São quatro, cinco mil “peças” com funcionamento individual independente divididas em subconjuntos encadeados entre si, evoluindo todas no mesmo ritmo mas cada uma com movimentos e funções diferenciadas, um olho no todo outro no seu subtema particular (abre-alas, baianas, passistas, porta-bandeiras, alas temáticas, “bateras”, destaques, etc) fazendo evoluções complicadas em direção a um objetivo comum e executando esse todo com precisão milimétrica de tempo e espaço.



E tudo isso rola na maior alegria, sem falar nas enormes doses de criatividade, dedicação gratuita e altruísmo (ainda) envolvidas na coisa.

Ou seja, até na festa que, pela sua outra vertente, é sinônimo de esbórnia, o brasileiro é capaz de se organizar impecavelmente e vencer pelo merecimento desde que haja uma regra igual para todos e efetivamente imposta entre ele e o objetivo a ser conquistado.

Da esbórnia faz-se a ordem e a harmonia porque este é o único caminho para prevalecer na disputa por esse campeonato (a “luta pelo poder”) e cada erro, cada passo fora da regra custa, infalivelmente, a perda de pontos até o limite do rebaixamento ou da desclassificação.

É mais uma imitação da vida, como tudo que nós, humanos, “inventamos”, governos inclusive.



É aí que entra o meu ponto. O Brasil e os brasileiros não são, irremediavelmente, o que lhe parece que sejam neste momento de triunfo dos desviados. O Brasil e os brasileiros estãocomo você descreve, Helena, porque esta é a regra que lhes é imposta, desde “lá”, da mais alta tribuna que o país inteiro vê e ouve.

Quem não entra na putaria não entra na política. O bom comportamento é sistematicamente punido e a sacanagem infalivelmente premiada. Não é que lhes é dado exibi-lo; os corruptos literalmente esfregam o seu sucesso na cara do país; afirmam abertamente que foi através da corrupção que o obtiveram. E é de “lá” que a regra desce Brasil abaixo.

O país inteiro é capaz de apontar filho de que governo; fruto de que sacanagem é cada bilionário, cada mega empresário. No meio ambiente econômico em que vivemos, quem cumpre as regras civilizadas perde a condição de competir (interna e externamente). Perde a “luta pelo poder”. Perde o seu lugar ao sol.



Se o sucesso passa a ser uma confissão de culpa, instala-se a subversão geral. E, ironicamente, instala-se porque, ainda que com a maioria dançando conforme à música para sobreviver e “dar certo”, a noção de certo e errado, o senso de Justiça inato na nossa espécie, subsiste, como prova a sua própria manifestação, Helena.

Pois é em cima desses bons sentimentos que cinicamente atuam os fariseus da política, os mesmos de onde emana toda essa subversão. Se o sucesso é uma confissão de culpa, basta acionar essa tecla quando o desespero provocado por esse sistema de exploração passa da borda do suportável. Eles próprios convocam, então, o apedrejamento da “zelite” e lá vêm as expropriações e os atos de “justiça social” (contra o “judeu” da vez, a imprensa, o Judiciário ou o que quer que esteja incomodando mais no momento…), com os quais os reis dos ladrões posam de heróis e garantem mais um século de poder devolvendo ao povo miserável migalhas do que lhe vêm roubando desde sempre.



Do Mestre de Avis, lá no nascimento de Portugal, ao Lula aqui da sua antiga colônia tem sido assim, sem tirar nem por. E o que tem garantido a perenização dessa arapuca é o apagamento sistemático da memória do povo que se obtém cultivando zelosamente a ignorância, esta que hoje é oficialmente louvada como uma espécie de benção remissora no país de Lula.

O estudo da História é que é a psicanálise das sociedades, Helena. Só quem sabe como e porque se tornou o que é pode recusar voltar aos caminhos para o abismo tantas vezes percorridos antes, escolher novos e, assim, mudar o que virá a ser no futuro.

A reforma, portanto, só terá efeito se começar por cima. A boa regra só se imporá, país abaixo, se for infalivelmente imposta ao primeiro da fila.



E aí, a receita básica é conhecida:
. todos são iguais perante a lei e não haverá foros nem prisões especiais;
. nenhum poder e nenhum dinheiro que não seja fruto do esforço e do mérito;
. ao crime deve corresponder infalivelmente o castigo…

Voltamos ao ponto de partida, Helena. Mas agora com os olhos fixos “lá”. “Eles” é que têm de se ver no espelho desse povo que disputa tão limpa e lindamente na avenida, e não o povo seguir se deformando para caber no espelho distorcido deles.

Entender isso claramente, afirmar sistematicamente essa visão, é tomar consciência de quem é que tem “a força“; é começar a agir.



16 de fev. de 2013

Abram alas para o agro

por Kátia Abreu



O agronegócio é o responsável, há anos, pelos sucessivos superavit da balança comercial

Quando a Unidos de Vila Isabel adentrou o Sambódromo, às 5h40 da terça-feira de Carnaval, já o personagem homenageado em seu samba-enredo, o homem do campo, estava em plena labuta. Não pôde assistir ao vivo a homenagem. Acorda-se cedo no meio rural. Ao alvorecer, todos já estão a postos. E mesmo feriados como o do Carnaval não interrompem a produção, que põe na mesa do brasileiro a melhor e mais barata comida do mundo.

O belíssimo enredo "A Caminho da Roça", com que a Vila Isabel venceu o desfile carioca, admirado em todo o mundo, fez, enfim, jus a um segmento da sociedade brasileira historicamente negligenciado (e vilipendiado) por parcela influente das classes cultas, em nome de interesses político-ideológicos. A luta pela estatização do campo, projeto antigo da esquerda revolucionária, tenta atribuir ao produtor rural a responsabilidade pelas mazelas sociais do país, quando a realidade é justo o oposto.

Nenhum outro segmento contribui tanto para o desenvolvimento econômico e social do país. Senão, vejamos: é o agronegócio o responsável, há anos, pelos sucessivos superavit da balança comercial brasileira e responde também por 30% dos empregos formais do país. Nosso superavit anual nas exportações é de US$ 79,4 bilhões; o superavit final do país é de US$ 19,4 bilhões, o que significa que o agro financia os US$ 60 bilhões de deficit dos outros setores. Dá cobertura, por exemplo, aos US$ 22,2 bilhões que os turistas brasileiros gastam lá fora, enquanto os estrangeiros deixam aqui apenas US$ 6,6 bilhões.

Mais: o agro brasileiro é hoje modelo em todo o mundo. Estudo sobre produtividade agrícola em 156 países, publicado pelo Ministério da Agricultura dos Estados Unidos (USDA), constata que o crescimento desse setor entre nós foi, na década de 2000, de 4,04%, enquanto a taxa mundial no mesmo período foi de apenas 1,84%. Deve-se isso ao aporte tecnológico e à dedicação ao trabalho -dedicação exaltada pelo enredo da Vila Isabel: "Semear o grão.../saciar a fome com a plantação/é a lida.../arar e cultivar o solo/ver brotar o velho sonho/alimentar o mundo/bem viver/a emoção vai florescer", diz um trecho do samba, cantado pelos milhares de foliões que lotaram as arquibancadas do Sambódromo.

Não obstante, ao setor se quer imputar a herança colonial-escravagista do país, rotulando-o como atrasado, quando, inversamente, é o que mais incorpora tecnologia de produção e mais investe no aprimoramento de sua mão de obra. Acusam-no de predador ambiental, num país que preserva nada menos que 61% de seu território com cobertura vegetal nativa e utiliza menos de um terço (27,7%) para a produção de alimentos. Nenhum outro país exibe números sequer aproximados.

A Amazônia, foco da cobiça internacional -e obsessão dos ambientalistas a serviço de ONGs estrangeiras-, teve reduzidos, de 2004 para cá, em nada menos que 84% os desmatamentos.Ninguém preserva -e conhece- mais a natureza e o ambiente que quem deles depende para sobreviver: o homem do campo. Daí o absurdo das acusações que lhe são assacadas.

Na linguagem do samba, pode-se dizer que o agro tem sido a comissão de frente da economia brasileira. Não atravessa o ritmo e garante há anos o desfile da vitória do desenvolvimento do país.
 
É, pois, inadmissível que não tenhamos ainda um sólido sistema de seguro agrícola e que se expulsem produtores rurais de suas terras em nome de uma antropologia ideologizada e ultrapassada, que conspira contra o bem-estar social. E ainda: que tenhamos os portos mais ineficientes do mundo, graças a uma minoria que defende interesses particulares em prejuízo do país.

A homenagem da Vila Isabel representa um importante -e justíssimo- reconhecimento do Brasil urbano e popular a um segmento que, como nenhum outro, o tem servido com competência e dedicação. E que, mesmo enfrentando forças obscurantistas e poderosas, não deixará de fazê-lo jamais. Aos que jogam contra o país, nosso lema é: abram alas!

Aquidauana


O vídeo institucional do município de Aquidauana (Mato Grosso do Sul) foi escolhido, por um júri internacional, como um dos melhores filmes de turismo na categoria Turismo de Ecologia e Natureza. É de ver em tela cheia.

Captado por JRB Martins

15 de fev. de 2013

Puma Punku

Reportagem do History Channel, dublada em português. O tom, à primeira vista, vai pro lado do espalhafatoso, mas dá para dar um desconto: o fenômeno é mesmo intrigante, fantástico, incompreensível, e os locutores ficaram mesmo muito impressionados, entusiasmando-se e aventando hipóteses incomuns.
Em tempo: pesquisei a dureza do diorito no Google mas as respostas não foram muito precisas; o que é certo é que sua densidade é superior à do granito devendo portanto, de fato, ser mais duro do que este.

12 de fev. de 2013

As nações não têm interesses

por Carlos Alberto Montaner, para o jornal paraguaio ABC Color

Jeane Kirkpatrick, a notável ensaísta e diplomata americana da era Reagan, costumava dizer, com alguma tristeza, que ela, como acadêmica, tinha sido treinada para buscar a verdade, mas, como diplomata, às vezes sua detestável função era ocultá-la.

O professor panamenho Guillermo (Willy) Cochez, proeminente democrata-cristão, ex-embaixador de seu país à OEA no atual governo de Ricardo Martinelli, enfrentou um dilema semelhante aos que mortificavam Kirkpatrick, e optou por dizer a verdade e obedecer à sua consciência, em vez de mentir ou esconder-se atrás de uma montanha de eufemismos. Essa postura lhe custou o emprego, mas ele ganhou o respeito de muitas pessoas.

O incidente ocorreu em 16 de janeiro na sede da OEA em Washington. Naqueles dias, se avaliava o caso insólito do presidente reeleito dos venezuelanos, Hugo Chávez, internado em um hospital de Havana, supostamente morrendo ou em estado muito grave, circunstância que deveria resolver-se de acordo com a Constituição, cujo texto estabelecia claramente que, ante fatos dessa natureza, deveriam realizar-se eleições em trinta dias, convocada pelo presidente da Câmara.

Ao Embaixador Cochez, que também é professor na Faculdade de Direito de uma universidade panamenha, pareceu intolerável o governo venezuelano violar a lei, ignorar a ausência de Chávez, e transmitir ilegalmente a autoridade ao vice-presidente Nicolas Maduro, tudo isso com a aprovação da OEA e de seu cantinflesco secretário-geral, José Miguel Insulza. Anteriormente, o mesmo organismo julgou com muita severidade as destituições dos presidentes Manuel Zelaya, de Honduras, e Fernando Lugo, do Paraguai, embora ambos os processos tenham se realizado dentro da lei em vigor nesses países.

Para Cochez, que tinha uma longa história pessoal de luta contra a narcotirania panamenha de Manuel Noriega, e de solidariedade com outros países que tentavam estabelecer a democracia, como no El Salvador de Napoleão Duarte na década de oitenta, seu amigo e compadre social-cristão, esta era uma oportunidade de dizer a verdade e ajudar os venezuelanos livres a denunciar o que realmente estava ocorrendo na Venezuela.

Em última análise, a Carta Democrática, assinada por todos os países membros da OEA, dava razão a Cochez. A Venezuela não era uma democracia verdadeira, mas uma variante de despotismo, sancionada nas urnas, onde não se respeitavam os direitos das minorias e não existiam poderes independentes. O Caudilho havia fagocitado as funções do Judiciário, enquanto o Parlamento, com uma maioria imposta por regras eleitorais abusivas, era apenas uma caixa de ressonância da voz do dono.

Ante este episódio, que mostra a consistência moral de Guillermo Cochez e a linguagem dupla e a covardia de muitas chancelarias, vale a pena recordar um item que é muitas vezes esquecido: é falso que as nações devem escolher entre os seus interesses e seus princípios.

Na realidade, as nações somente podem ter princípios. Nações são abstrações. São tribos unidas por laços espirituais intangíveis. São os indivíduos, as empresas, os partidos, que têm interesses.

O Senhor Chávez tem corrompido numerosos grupos e líderes políticos com suas maletas cheias de petrodólares, como as que se descobriram na Argentina; e tem extirpado a decência de comportamento de países pequenos que se beneficiam de envios de petróleo em condições favoráveis, como ocorre em quase todo o Caribe, mas essa conduta imoral tem um nome no direito penal: "submissão voluntária à extorsão".

Todos esses políticos e governantes latino-americanos que olham para outro lado quando o chavismo atropela os venezuelanos, fecha ou assedia os meios de comunicação, ajuda as narcoguerrilhas comunistas colombianas, conspira com a ditadura teocrática iraniana para desenvolver armas nucleares, ou contribui com recursos para o triunfo de seus cúmplices na construção desta grande jaula chamada socialismo do século XXI, não estão defendendo os interesses de seus países: estão pisoteando os princípios em que se assentam suas nações. Estão apodrecendo as bases morais das sociedades que dizem representar. Isso, simplesmente, é muito grave.

Obrigado, Embaixador Cochez, por se opor a essa imundície.

9 de fev. de 2013

A mágica dos batedores de carteira acabou. A farsa mostra os dentes


por Reynaldo Rocha

Havia uma herança, qualificada de maldita pelos asseclas dos corruptos que transformaram um país real em uma ilusão de circo.
Esta herança permitiu que embriagados governantes e mentirosas coléricas assumissem o comando do Brasil, E fossem mitificados. Como se tivessem participado de construções que sequer os admitiriam como auxiliares de pedreiro.
Como vulgares batedores de carteira, proclamaram-se donos do que roubaram. E tentaram mais: roubar a história.
Distribuiram cargos a incompetentes. Bastava que fossem fiéis ao comando da quadrilha. Ressuscitaram cadáveres que sepultamos em cova rasa. Uniram-se à podridão, a tal ponto que não conseguimos mais distinguir a lama do esgoto. São uma coisa só.
É caso de festejar o que está por vir? O retorno da inflação, o perverso imposto que sufoca a todos?
Não creio. Não quero. Não desejo.
Mas parece-me inevitável. Nada do que se disse, expôs e cobrou foi levado em conta. Os ignorantes orgulhosos preferiram debitar as críticas na conta de sempre: só discordam do governo iluminado os que sempre são do contra.
Reclamar do inchaço da máquina administrativa? Da ineficiência derivada da falta de planejamento? Da corrupção que multiplica por dois o valor de qualquer obra? Dos companheiros que nunca souberam administrar sequer uma loja de R$ 1,99? Da ingerência absurda do Estado na economia, só chamando a odiada (por eles) iniciativa privada quando não há mais conserto nem recurso?
Valeu trocar “privatização” por “desestatização”, como agora se lê?
A fórmula de FHC não era poção mágica. Era caminho, direção. Eles nunca entenderam isto. Os ignorantes que nada sabem fingem saber de tudo.
A Petrobras arrasada por Gabrielli e Lula. O BNDES reduzido a agência de socorro para amigos do governo. Fundos de pensões estatais aplicam mal e porcamente o dinheiro dos associados.
E assim se cria uma ilusão. Guido Mantega, como Cristina Kirchner, já é uma piada internacional. A credibilidade que o Brasil conseguiu a duras penas no governo FHC e foi mantida por Henrique Meireles (tucano, nunca aceito pelos geniais economistas do PT!) está perdida.
A nós resta a certeza de que virão dias difíceis. A mágica acabou. A farsa mostra os dentes.
Restará uma herança. Esta sim, maldita.
Na era da mediocridade, perdemos o que ganhamos.
A dignidade, a ética, a supremacia da verdade, o respeito ao estado de direito e à diversidade de ideias, isso já estava perdido.
Perderemos a última construção de governos anteriores.
Eles não se importam. Nunca se importaram com nada que não fosse elogio ou histérica idolatria.
O que vai sobrar?
Sem oposição, sem crítica e sem quem nos represente, resta observar o covil dos lulopetistas destruindo com as patas sujas o que nunca conseguiram entender.
E que nós, mais uma vez, teremos que reconstruir.
Resta saber com quem.

Santa Maria - A tragédia e seus sócios


por Guilherme Fiuza

(...)
A Kiss era um coquetel de riscos – evidentes – que não foram evitados for uma soma de omissões. Mas tragédia com muitos culpados dificulta o espetáculo do linchamento. Por que o músico da banda foi preso? Porque o show tem que continuar.
E hoje não pode haver show grandioso no Brasil sem a presença do governo popular. Num passe de mágica, poucas horas depois do incêndio, quem estava em todas as manchetes? “Dilma cancela”, “Dilma volta”, “Dilma chora”. E Dilma faz comício para milhares de prefeitos, ordenando-lhes que a tragédia de Santa Maria não se repita. Como é fácil ser presidente.
Já que seu discurso nunca quer dizer nada, o jeito é entendê-la por gestos. Aí tudo fica claro: escondido na aba da presidente, por exemplo, há um ministro com alvará vencido. Após faturar R$ 2 milhões com consultorias fantasmas, Fernando Pimentel foi interditado pela Comissão de Ética da Presidência. O que fez Dilma, a sensível? Interditou a Comissão de Ética – e manteve o ministro pirotécnico no cargo.
Este é apenas um dos muitos exemplos de legalidade que a líder da nação oferece a bombeiros, prefeituras e donos de boate. Sem falar no risco energético que o país corre para sustentar o truque da bondade tarifária.
Assim o governo popular estimula o cumprimento das regras: durante anos, a presidente e seu padrinho mantiveram como sua representante oficial Rosemary Noronha, que atuava sobre as agências reguladoras – as que criam as regras – como negociante de cargos e propinas. As ações dos companheiros de Dilma que não deixam dúvida: driblar a lei dá lucro.
Os donos de boates piratas em todo o Brasil têm, portanto, em quem se espelhar. Por esse ângulo, até dá para entender que Dilma seja a estrela da tragédia.