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11 de ago. de 2013

Lula, o idiota maior, e a grande revolta dos imbecis

por Luís Dolhnikoff

Antes que algum idiota hipotético e conotativo pense em me processar por difamação, injúria, calúnia ou qualquer outra fina figura jurídica, esclareço e adianto que a palavra idiota no título e no restante do texto é usada em sua condição denotativa. Nesta, a palavra, derivada diretamente do grego idiotés, significa privado, particular, em oposição a público e a político. Pois no mesmo grego, político, ou melhor, politikós, é o relativo à comunidade, à cidade, mais exatamente, à pólis. O cidadão (habitante da cidade) que a ela se dedica é, portanto, politikós – enquanto aquele que lhe dá as costas para cuidar de seus negócios pessoais, particulares, privados (numa palavra, idiói), é um idiotés.

A conotação de imbecil, burro e/ou cretino, em todos os sentidos destes termos (cretino, por exemplo, é originalmente um termo médico, equivalente a débil mental), que a palavra idiota adquiriu, advém do fato de que, para os gregos, só podia haver vida inteligente no âmbito politikós, em que um homem era posto à prova, ao mesmo tempo, em suas virtudes e em suas capacidades, incluindo iniciativa, coragem, conhecimento, honestidade e discurso político para falar na assembleia dos cidadãos; nada disso era demandado ou testado no cuidar de seus negócios particulares.

Mas Lula é, por profissão, um político. Se é, ao mesmo tempo, um idiota, é um idiota político, ou um político idiota, o que denotativamente é igual. Igual e igualmente contraditório: pois como pode um homem ser ao mesmo tempo dedicado à pólis, à política, à coisa pública, e se dedicar apenas às suas questões pessoais, particulares, e ser assim um idiota? A resposta está na traição da política, na sua inversão ou subversão. Se a política perde sua substância ou natureza de coisa pública, passa a ser idiota sem com isso se tornar contraditória. Pois sua contradição estaria, então, com a própria política em seu sentido original.

Tudo fica mais claro ao se comparar e contrastar com outro par de conceitos, o político e o estadista. Se o político é aquele que se dedica à pólis, o estadista é quem se dedica ao Estado. Mas isto em suas denotações, que, neste caso, esclarecem pouco ou nada face às suas conotações. Começando pelo último, um estadista é o político que deixa de lado seus interesses particulares pelo interesse maior do país. O caso paradigmático notório da política contemporânea é Nelson Mandela. Depois de 27 anos de prisão, foi libertado e alçado à condição de presidente. Mas exerceu apenas um mandato, sequer se candidatando à reeleição. Houve vários motivos, mas o principal e talvez menos conhecido foi o fato de que Mandela afrontou a maioria das demais lideranças do CNA (Congresso Nacional Africano), seu partido e maior partido do país, a fim de barrar o caminho da revanche ou vingança contra a minoria branca, depois do fim do apartheid. Essa tendência era forte o bastante no partido para que Mandela tivesse de usar todo seu cacife político a fim de abortá-la, com isso evitando uma guerra civil e a destruição do país. Mas também garantindo o fim de sua curta e tardia estadia no poder. Ao contrário e à diferença do estadista, o político comum deixa de lado os interesses maiores do país por seus interesses pessoais. Portanto, apesar da aparente contradição, a maioria absoluta dos políticos é idiota. No caso brasileiro, Lula é, então, apenas o mais idiota deles. Ou o maior idiota entre eles.

Depois de vinte anos de oposição, em que Lula e o PT firmaram e afirmaram serem um político e um partido políticos, que queriam chegar ao poder para tirá-lo das mãos dos idiotas, dos grupos de oligarcas que loteavam o Estado em causa própria, para devolver o Estado à cidadania, à cidade, à pólis, o que se viu foi o contrário. Ou seja, a transformação do PT e de Lula em mais um partido e em mais um político idiotas, ocupados e preocupados em seu interesse maior, principal e, no limite, único, seu projeto particular (ou idiota) de poder. Isto é fato notório e indiscutível. Menos notório hoje, pois relativamente esquecido (ainda que igualmente indiscutível), foi o primeiro e principal motivo alegado para tal transformação. Ele pode ser resumido na palavra “governabilidade”, e assim traduzido: as reformas que fariam do Brasil um Estado cidadão, em vez de um Estado ladrão ou idiota, que toma muito de quase todos para dar muito a poucos e muito pouco aos demais, ou seja, as reformas política, fiscal, jurídica e educacional, para começar, não foram então implantadas porque o “sistema político” idiota não o permitiu. Logo, façamos o possível – o que, na prática, se traduziu em não fazer nada para transformar o Estado brasileiro de idiota para político. Mas já que estamos aqui, ao menos usemos o idiota do Estado brasileiro para servir ao nosso próprio grupo de políticos idiotas. Afinal, somos idiotas, mas não imbecis.
Há todavia um porém: Lula e o PT tinham, quando de sua primeira eleição presidencial, um cacife político enorme, que ninguém jamais soube ou saberá se suficiente para afrontar, ao menos em parte, e em que parte, a arraigada idiotia da política nativa. Porque esse afrontamento, em nome das reformas que eram a própria razão histórica e política do PT e de Lula, não foi na verdade tentado. Se não foi tentado, afirmar, como fariam depois Lula e o PT, que era a priori impossível, é retórica, falácia, sofisma ou mentira. O fato insofismável é que Lula e o PT logo se tornaram apenas e simplesmente uma nova parte da velha massa de políticos idiotas, e estamos conversados.

É a idiotia do PT em geral e de Lula em particular que explica a recente revolta da cidadania brasileira contra a idiotia da política nacional. Pois se o partido e o líder que se fizeram historicamente, no período posterior à ditadura militar, como aqueles que repolitizariam essa política, ou a desidiotizariam, não o fizeram, e se além de não o fazerem a reforçaram, tornando-se os mais idiotas da política nativa, ou seja, os mais agarrados ao seu projeto particular de poder, deixava então de existir, em todo o espectro político brasileiro, qualquer opção dirigida a essa repolitização ou a essa desidiotização da política.

Nesse contexto, o papel do mais que idiota governo Dilma, com sua aliança figadal com os maiores idiotas políticos do país, conhecidos como oligarcas ou fisiológicos, agrupados em siglas como o PMDB e atendendo por nomes como José Sarney, Renan Calheiros e Paulo Maluf (apoiador do candidato de Dilma, de Lula e do PT em São Paulo, Fernando Haddad), foi o de confirmar e reconfirmar, depois da radicalmente idiota “era Lula” (cujo grande esforço político seria afinal fazer seu sucessor, a própria Dilma), o completo abandono, pelo PT, do resgate da política pelo combate à idiotia. Com isto confirmado e reconfirmado, não havia mais saída da idiotização da política senão fora da política idiota. O que explica a cidadania tomar as cidades, único caminho restante para retomar o que é da pólis, a política que merece o nome.
Lula, o grande idiota da política brasileira contemporânea, está, portanto, completamente certo quando afirma e reafirma, como vem afirmando e reafirmando, que a recente revolta popular no Brasil se deve aos seus governos. Não, obviamente, para quem não é minimamente estúpido, pelos motivos que alega, ou seja, suas “grandes conquistas”: segundo Lula, o idiota maior da política menor brasileira, que portanto acredita poder enganar a todos todo o tempo, o aumento de consumo “por ele” conquistado seria a causa dessa revolta, pois os perfeitos imbecis dos cidadãos brasileiros, ao perceberem, por obra e graça de Lulinha, o Grande, que podiam consumir, não se contentariam mais em ser tratados, digamos, como perfeitos imbecis pelo Estado idiota brasileiro, como sempre o foram. Ocorre que tais famosas “conquistas” lulopetistas não incluem nenhuma das reformas históricas necessárias para resgatar a política brasileira – pois limitadas, fundamentalmente, a esse famoso aumento de consumo pelos mais despossuídos, sem sequer o incremento da produção e da produtividade, pelo lado econômico, ou da educação, pelo lado da cidadania. E sem falar do exercício podre do poder. Cuja podridão se espalha, afinal, por todo o país, envolvendo desde a infraestrutura física (daí a famosa “[i]mobilidade urbana” tornar-se um problema intratável) até a superestrutura moral (daí o país ser o infame recordista planetário de mortes por assassinato). O Brasil é, enfim, um país apodrecido (podre o poder, podre a educação pública, podre a saúde pública, podre a segurança pública, podre tudo o que é público), liderado por idiotas e habitado por imbecis. Até ontem.

De fato, a recente revolta popular no Brasil se deve diretamente aos governos da “era Lula”, incluindo o de sua sucessora, seguidora e títere: mas apenas porque tais governos foram a maior e a mais evidente traição histórica recente à promessa jamais resgatada, por nossa superidiota classe política, de politizar a política brasileira. Isto será então necessariamente feito, não importa como, pelos ex-imbecis, afinal desimbecilizados pela insuportável demora dos inquilinos do poder em se desidiotizar.