_________________________________________________

_____________________________________________________________________________________________

8 de dez. de 2011

O padrão chinês e a cegueira ocidental

por Fernão Lara Mesquita

Resumo dois casos publicados na imprensa brasileira e norte-americana esta semana:

1

Diante do crescimento de 60% nas importações de tecidos e confecções chinesas somente no ano que passou, a Associação Brasileira da Industria Têxtil, junto com entidades similares dos Estados Unidos e do México, encomendou pesquisa sobre os subsídios do governo chinês a esse setor.

Encontraram 27 formas diferentes de subsídio que vão de reduções de impostos a empréstimos a fundo perdido de bancos do governo. Esses planos de subsídios que antes eram quinquenais agora duram 12 anos.

O Departamento de Defesa Comercial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior tem 30 analistas para avaliar pedidos de investigação antidumping de todo o país. O equivalente norte-americano tem mais de 3 mil.

Resultado: o Brasil que em 2005 era exportador nesse setor com superávit de US$ 703 milhões, passou a ser importador com déficit, apenas até outubro deste ano, de US$ 4 bilhões. Em consequência, a produção caiu 16%, o parque industrial está cheio de ociosidade e os investimentos do setor que, em 2010, foram de US$ 2 bilhões, sendo 40% em São Paulo, este ano estão estagnados.

2

A Cathay Industrial Biotech é uma companhia privada chinesa fundada em 1997 por Liu Xiucai, 54, um dos jovens estudantes que o governo chinês mandou para os Estados Unidos no começo do processo de abertura de Deng Xioping, para tirar o atraso científico e tecnológico em que quase meio século de comunismo tinha mergulhado o país.

Foi um bom investimento.

Ha alguns anos a Cathay desenvolveu uma tecnologia em que bactérias fermentando hidrocarbonetos em escala industrial produziam um polímero altamente avançado que era usado na fabricação de lubrificantes, drogas contra diabetes e nylons especiais.

A Dupont se tornou sua maior cliente; a Cathay dominou o mercado mundial desse produto; o Goldman Sachs reuniu investidores que aplicaram US$ 120 milhões na empresa e ela estava se preparando para um IPO que deveria ter ocorrido no início deste ano.

Mas foi tudo por água abaixo.

Como é quase praxe hoje em dia na China, um de seus empregados mais graduados roubou a fórmula da Cathay e, com apoio da Academia de Ciências e do Partido Comunista Chinês, abriu uma empresa concorrente, a Hilead Biotech, que entrou no mercado com produto idêntico ao da Cathay vendido a preço menor que o custo. Para "nascer", a Hilead recebeu um empréstimo subsidiado de US$ 300 milhões do Banco de Desenvolvimento da China depois que o secretário do partido na província de Shandong, um dos homens mais fortes do Politburo, deu o seu aval pessoal à companhia.

A Cathay processou a Hilead por roubo de patente, mas a Hilead contra processou a Cathay afirmando que foi ela quem roubou aquela patente da Academia de Ciências da China para quem Liu trabalhara no início dos anos 90 logo depois de se formar nos EUA, desenvolvendo fórmulas de remédios fabricados no Ocidente com patente vencida para melhorar a condição média de saúde na China.

A usurpação de empresas privadas de sucesso pelo Estado chinês, nestes tempos em que o PCC teme cada dia mais ser desafiado em seu poder por empresários poderosos, se tornou tão comum que já existe um neologismo para designá-la - "guojin mintui", que pode ser livremente traduzido como "enquanto o Estado avança o setor privado recua".

E se eles tratam assim as patentes nacionais, imagine as estrangeiras. (A matéria é doNYTimes e pode ser lida ).

Conclusão

Quando se cansar de festejar "a crise e as contradições internas do capitalismo" e a "decadência do império americano" o mundo poderá começar a agir contra a real fonte dos seus problemas que é a entrada em cena de um jogador desonesto que trata reivindicações trabalhistas a bala e rouba o trabalho alheio sem a menor cerimônia, enquanto empurra, com seus monopólios estatais, o resto da economia mundial de volta ao passado feudal dos monopólios dos amigos do rei, de um lado, e a massa dos súditos sem direito a nada do outro.

Dentro dos próprios Estados Unidos, a mesma coisa. Quando eles se cansarem de se acusar mutuamente pelo problema de que todos são vítimas naquele ridículo jargão "Brasil anos 70" que tomou conta da imprensa local e começarem a se defender do jogador que bagunçou a economia mundial cometendo todo tipo de falta impunemente, poderão voltar à velha e boa fórmula do Estado moderador do poder econômico que eles próprios inventaram e ninguém ainda superou. Aquele Estado armado da poderosa ferramenta antitruste sob a qual ninguém, nem mesmo em função de mérito, podia ficar grande o suficiente para se tornar uma ameaça, ferramenta esta que teve de ser guardada no fundo de uma gaveta quando a China inundou o mundo dos trabalhadores com direitos de produtos roubados feitos pela sua multidão de semiescravos.

Até lá, teremos de esperar pacientemente que se esgote o falso debate pontuado pelos arroubos retóricos e pela vontade de brilhar de jornalistas e "especialistas" que não enxergam um palmo adiante do nariz, dos quais se servem alegremente os políticos desonestos que querem apenas o seu turno no poder e que o mundo se arrebente depois que eles se locupletarem nele.

[ Reprodução de post do mesmo nome, do blog Vespeiro. ]

Nenhum comentário: