Uma das
razões do atraso brasileiro são as escolhas erradas em relação ao que é
importante e o que é prioritário, o que contribuiu para o país se especializar
em combater o inimigo errado e fazer os investimentos menos capazes de superar
o atraso.
Citemos
dois fatos:
Fato 1.
Os
bancos vêm apresentando altos lucros em seus balanços, provocando, como sempre,
broncas e protestos. Um parlamentar afirmou que teria de haver um limite ético
para o lucro dos bancos. Será mesmo? Valem aí duas perguntas: a) com quais
critérios se poderia julgar o lucro de uma atividade empresarial? b) será que
deve haver limite ético para o lucro de qualquer empresa? Um exemplo
interessante: a Petrobras, sozinha e beneficiada pelo monopólio, lucrou mais do
que dez grandes bancos juntos sem que os detratores dos banqueiros tenham
proposto um limite ético para o lucro da Petrobras.
Analisemos
o caso. O que deve ser tomado como base para se saber se o lucro é condenável
ou não é apenas “a forma como ele é obtido”. Primeiro, é aceitável, e
desejável, todo lucro que derive de atividade reconhecida pela sociedade como
algo de valor, útil e necessária. Segundo, é inaceitável todo lucro obtido em
atividade não reconhecida pela sociedade como útil e de valor ou mediante
favores ou privilégios negados aos concorrentes.
Na época
da inflação, o sistema financeiro chegou a representar um quinto de todo o
Produto Interno Bruto (PIB), o que não é razoável, situação possível porque o
organismo econômico vivia doente, sob infecção inflacionária.
O volume
de atividade e de lucro dos bancos era muito superior ao valor reconhecido pela
sociedade e bem maior do que internacionalmente se aceita como percentual
razoável em relação ao PIB. Essa situação era condenável, mas não por culpa dos
bancos, e, sim, por culpa de uma economia distorcida pela inflação e por
governos perdulários.
Nesse
assunto, não há que meter a ética no meio nem culpar os banqueiros, pois o
responsável pela inflação mora em Brasília, nos governos estaduais e nas
prefeituras. Ademais, a moral situa-se em outra ordem. Os bancos são meras
empresas, que se nutrem do mercado, saudável ou doente. Os bancos são
necessários em qualquer economia, mas devem estar limitados ao tamanho razoável
do setor financeiro em relação ao todo. O tamanho exagerado dos bancos vinha da
inflação e bastou que ela fosse debelada para que as atividades bancárias
retrocedessem muito. Se o setor financeiro diminuiu, não foi por razões morais;
foi por razões econômicas.
Fato 2.
O
governo anunciou que metade da população brasileira não tem acesso a saneamento
básico. Isso é tenebroso, contra o que a sociedade precisa se indignar e lutar.
Os especialistas afirmam que uma criança entre zero e três anos e que sofra
alguma doença derivada da falta de água tratada pode ter sua acuidade mental
prejudicada pelo resto da vida. Essa criança tem sua capacidade intelectiva
reduzida, fica com dificuldades para aprender e sua qualificação profissional é
prejudicada.
Se é
certo que a criança pode ter sua capacidade mental afetada por doenças
derivadas da simples falta de esgoto e de água tratada, passando a ter
dificuldades para aprender os conteúdos da educação básica, então o saneamento
deveria ser elevado à condição de prioridade maior do país. Na semana em que
abundaram notícias sobre o drama do saneamento básico, qual foi o grande
assunto no governo? Estádios de futebol e trem bala.
Um país
em que metade de sua população não tem rede de esgoto está com o futuro
seriamente comprometido. É triste demais, sobretudo se esse país não for
miserável, como é o caso do Brasil. Cabe perguntar: “Para onde estão indo os
40% da renda nacional que a sociedade entrega ao governo em forma de
tributos?”. A revista ÉPOCA, em sua edição de 12/06/2011, ajuda a responder a
essa pergunta. Em extensa reportagem, a revista mostra que somente o governo
federal tem participação em 675 empresas, entre estatais que ele controla e
empresas privadas das quais ele participa como sócio.
Definitivamente,
no quesito de saber o que é importante e que é prioridade, o Brasil tem
falhado. E não há sinais de que isso vá mudar tão cedo, apesar de a presidente
Dilma Rousseff ter levantado o problema da falta de saneamento em seus debates
quando era candidata. Mas, candidato é candidato, governo é governo.
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